Para os seguidores de religião de matriz africana, ‘Xangô’, orixá da Justiça, ajudou para que o evento desta terça-feira (16) fosse realizado. E o encontro foi, de fato, esclarecedor e teve um caráter educacional importante. Durante toda a manhã, no terreiro Ilê Axé Legionirê Nitó Xoroquê, localizado no complexo Benedito Bentes II, ocorreu a 1ª reunião da 61ª Promotoria de Justiça da Capital com pessoas ligadas ao Candomblé e a Umbanda. O encontro foi proposto pelo titular da referida Promotoria, promotor Flávio Gomes da Costa, e teve o objetivo de apresentar o Ministério Público Estadual de Alagoas aos pais e mães de santo e saber de que forma o MPE pode atuar no combate ao preconceito e à intolerância religiosos.
“Resolvemos fazer a audiência pública numa casa de santo exatamente para mostrar aos representantes das religiões afrodescendentes que nós estamos à disposição deles para ajudar naquilo que for necessário. Vamos agir no sentindo de exigir o fim do preconceito contra os credos de matriz africana e trabalhar para que tais comunidades possam exercer a sua profissão de fé em paz. O MPE quer respeito à liberdade religiosa, acima de qualquer coisa”, defendeu Flávio Gomes.
“Estamos muito felizes com essa iniciativa do Ministério Público. Apenas para que a sociedade tenha uma ideia do tamanho do preconceito que sofremos, há pessoas da nossa própria religião que têm medo de dizer lá fora que é do Candomblé. Elas sabem que serão alvo da intolerância de muitos cidadãos e, para evitar situações constrangedoras, negam suas origens, o que é péssimo para nós. Com essa abertura que nos foi dada, a partir deste momento, já sabemos a quem devemos recorrer quando precisarmos”, declarou a yalorixá mãe Zázi.
Para o superintendente de Cidadania e Direitos Humanos da Secretaria de Estado da Mulher, Cidadania e Direitos Humanos, Geraldo Magela, o MPE foi pioneiro nesse tipo de comportamento. “É inovador. Nunca antes na história do Ministério Público houve uma audiência desse tipo dentro de um terreiro. Isso mostra que a instituição quer se aproximar do povo, independentemente de crença, raça, ideologia. Se o Estado já vinha contando com a parceria do MPE em determinadas situações de intolerância, agora então, esses laços serão estreitados, certamente. E garanto que a nossa parte continuará sendo feita de forma que consigamos atender aos anseios dessas comunidades”, disse ele.
O encontro foi encerrado com a apresentação de um ritual. “Foi um momento de agradecimento pelo sinal de respeito e consideração repassamos a nós. Finalmente teremos a oportunidade de mostrar para Alagoas que nós fazemos parte de religiões que também existem para trazer e levar o bem. Não participamos de rituais de magia negra, não cultuamos o diabo e nem fazemos quaisquer coisas que possam prejudicar outra pessoa. Reverenciamos nossos orixás, nossos cultos são aos desuses da natureza e todas as cerimônias realizadas são para buscar energias positivas”, esclareceu o pai Manoel, dono da casa de santo Ilê Axé Legionirê Nitó Xoroquê.
Comunidades tradicionais de Matriz Africana lutam para se manter vivas
No processo de luta pelas suas sobrevivências física, social e cultural, os seguidores de religiões de matriz africana utilizam variadas estratégias para não deixar que seus credos caiam no esquecimento e se descaracterizem. “Eles continuam brigando pela preservação e reinvenção das práticas tradicionais. Territórios de resistência política e cultural foram criados como espaços de enfrentamento da violência, do fortalecimento da identidade, da memória coletiva e de vivência das tradições de matriz africana. Entretanto, sobre essas comunidades, lideranças e demais integrantes, tem incidido, historicamente, extrema brutalidade em função do racismo e suas mazelas, pela negação de valor, de humanidade à ancestralidade africana no Brasil e o MPE não vai aceitar que aceitar que esse tipo de preconceito continue existindo”, alertou Flávio Gomes.