Lançada há quatro anos, a campanha “Com criança não se brinca”, do Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE/AL),foi exibida pela promotora de Justiça Dalva Tenório aos alunos do curso de Medicina da Universidade Tiradentes (UNIT), do Campus Maceió. O projeto tem como base a preocupação com o número alarmante de casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes registrados em no estado.

Segundo a promotora de Justiça, há um histórico robusto de abusos sexuais registrados contra adolescentes. Não diferentemente do que ocorre com crianças, e pode ser considerado monstruosidade, nas palavras de Dalva Tenório, o quantitativo requer um cuidado especial e ações preventivas que possam orientar famílias cuidando para que se blinde possíveis alvos.

Para a mentora da campanha, esse é um trabalho que visa coibir e prevenir o abuso sexual como um todo. “É preciso mostrar à sociedade e fazer com que ela quebre o silêncio. A criança quando é vítima não consegue se expressar diretamente, ela silencia. Então é necessário que sejam observados os sinais como machucados, o comportamento por exemplo. Então vivemos na busca efetiva da expressão”, declarou a titular da 59ª Promotoria de Justiça de Capital.

A promotora de Justiça também destacou um ponto crucial e considerado uma agravante em relação aos fatos diagnosticados.

“Quase sempre, deparamo-nos com casos no meio familiar, e isso se torna mais difícil de combater porque nem sempre as pessoas querem denunciar. E temos a obrigação de alertar para o crime e o tamanho do estrago que faz na vida da vítima, seja criança ou adolescente”, concluiu Dalva Tenório.

Papel do futuro médico

Para os futuros médicos, a promotora de Justiça lembrou a responsabilidade profissional de trabalhar com um olhar sensível e cuidadoso.

“Vocês vão conviver com as crianças em comunidades pobres e devem perceber o que acontece com elas, além da doença. Eu já pego o caso quando o trágico ocorreu, vocês não. E o abuso sexual é um crime ‘democrático’. Ele não tem cor, não tem raça, não tem religião ou classe social. Ele está em qualquer lugar”, afirmou a titular da 59ª Promotoria de Justiça de Capital. E foi além com um lembrete que, para ela, não pode passar despercebido: “precisamos trabalhar a sociedade para provocar indignação”.

A promotora de Justiça demonstrou inconformismo diante da possibilidade de aprovação do Projeto de Lei que reduz a pena para estupro.

“Imagine vocês se essa estupidez for aprovada. Um crime que produz violência física e psicológica e acaba com a liberdade das pessoas para sempre. E agora querem diminuir a punição para quem o comete, isso é revoltante. Espero, piamente, que não passe”, ressalta Dalva Tenório.

Novo olhar

Maíra Rodrigues, estudante do 3º período do Curso de Medicina da Unit, considera de grande valia a iniciativa da instituição em abordar tema tão profundo e, que para ela, servirá de apoio enquanto acadêmicos e profissionais formados.

“É muito interessante, porque não estamos apenas absorvendo teoria. Estamos acrescentando ao nosso conhecimento informações que nos estimulam a ter um olhar mais crítico na abordagem com as famílias. Estamos aprendendo que não devemos ver somente a saúde física, mas perceber o que está ocorrendo na vida do paciente, no caso as crianças e adolescentes, em sua comunidade”, explicou a universitária.

O médico pediatra Samir Kassar, professor do curso, enfatizou pontos importantes. “Eles vão mais vezes ao médico, antes de irem a Justiça. Eles preferem o primeiro contato com um médico, porque veem nele uma pessoa confiável. E como profissional de saúde é importantíssimo saber os meios legais e não negligenciar. O médico tem obrigação de se envolver”, reforçou.

A assistente social Rose Mary Araújo, que faz parte da comissão do núcleo do curso de Medicina, esclareceu que escolheram discussões temáticas que só têm a contribuir com os estudantes a partir de agora.

“É preciso começar a despertar nos alunos um olhar diferenciado para as crianças e os adolescentes. Eles são os futuros médicos, têm a obrigação de olhar para os pacientes como sujeitos e não o recorte para a doença em si”, afirmou a profissional da área da Saúde.

Já para Roseane Duarte, também assistente social e professora da Unit, a contribuição da formação está na construção de um novo olhar da Medicina, o olhar jurídico.

“Não basta somente saber identificar o problema, mas lidar com ele no mundo em que vão trabalhar. É ter um olhar jurídico, enquanto profissional de saúde para fazer acontecer os direitos”, concluiu a professora.