O Ministério Público do Estado de Alagoas, através da Fazenda Pública Estadual, expediu, nesta terça-feira (19), recomendações, visando a melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como o respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo para adoção das providências cabíveis a respeito de um convênio formalizado entre o Departamento Estadual de Trânsito de Alagoas (Detran/AL) e a Polícia Militar de Alagoas. Durante investigações realizadas pelo MPE, foram constatadas irregularidades no referido convênio, haja vista que PMs foram cedidos ao serviço de vistoria do Detran, tendo sido desviados de suas funções. Além disso, como troca pela cessão dos militares, a corporação passou a receber recursos advindos do pagamento de multas feito ao Departamento, dinheiro cujas motivações de seus gastos não convenceu ao promotor de Justiça Coaracy Fonseca.
Na notificação recomendatória, o diretor do Detran, Luís Augusto Santos Lúcio de Melo e o comandante da Polícia Militar de Alagoas, Dimas Barros Cavalcante, foram orientados a cancelar o contrato firmado. Eles têm prazo de 10 dias para seguir a orientação da 17ª Promotoria da Capital e apresentar explicações a respeito do assunto.
As investigações tiveram início em 29 de novembro do ano passado, através do Procedimento Administrativo nº 34/2012, após uma representação anônima entregue ao promotor de Justiça Coaracy Fonseca. Diante das informações recebidas, o MPE solicitou às duas instituições cópias do contrato e de documentos relativos ao convênio. E foi a partir do recebimento do material, especialmente do convênio nº AGESA – 008/2006, que a Fazenda Pública Estadual comprovou que 21 policiais militares, entre cabos, sargentos, sub-tenentes e tenentes, estavam realizando o serviço de vistoriadores no Departamento, atividade completamente diversa do policiamento ostensivo. Tal parceria já estava, inclusive, na execução do seu 8º Termo Aditivo.
“A Polícia Militar de Alagoas, apesar de integrar o Sistema Nacional de Trânsito, difere dos órgãos e entidades executivos, incumbindo somente a estes últimos as vistorias e inspeções veiculares. No que se refere ao trânsito, compete à PM tão somente as atividades de fiscalização e policiamento ostensivo, refugindo de suas atribuições atividades meramente administrativas. É por isso que o desvio de policiais para esse tipo de atuação, no âmbito dos órgãos de trânsito, também afronta a Lei de Organização Básica da Polícia Militar de Alagoas (Lei nº 6.230/2001)”, argumentou o promotor de Justiça.
“Todos nós sabemos a relevante função do policial militar no exercício do policiamento ostensivo de trânsito. Seu papel é assegurar a livre circulação e evitar acidentes, por meio da prevenção e repressão de atos relacionados com a segurança pública e da garantia de obediência às normas de trânsito. Portanto, não se pode aceitar que as atividades hoje exercidas no Detran de vistoria sejam exercidas por PMs. Elas têm que ser desenvolvidas apenas por meio de agentes civis de trânsito e, para isso, faz-se necessário quadro suficiente, um problema a ser resolvido mediante concurso público e não por meio de convênio com a Polícia Militar”, explicou Coracy Fonseca.
Polícia Militar recebe dinheiro para ceder PMs
De acordo com o Ministério Público, um convênio só deverá ser formalizado quando ficar configurado o interesse comum, mediante mútua colaboração, entre a Administração e entidades públicas ou privadas, o que não estaria comprovado nesse caso em específico. “Não é possível vislumbrar o interesse público da Polícia Militar no estabelecimento do convênio em questão, já que apenas ela designa servidores do seu quadro para a prática de atividades junto ao Detran, não recebendo contrapartida em serviços, não apresentando um objetivo em comum. O único interesse da Polícia Militar do Estado de Alagoas poderia ser a contraprestação financeira que lhe é designada por meio da cláusula 5.1 do convênio firmado em 2012, que prevê a disponibilização de 35% do valor das multas arrecadadas para à PM, montante este a ser revertido para uso da corporação. Antes, esse dinheiro era voltado para a cobertura de despesas específicas na área de saúde dos policiais e para cobrir as despesas dos Batalhões ou Frações autuadoras. Hoje, os recursos não têm mais esse objetivo”, detalhou a autoridade ministerial.
“Além do que, as verbas repassadas têm evidente natureza de remuneração, já que uma das partes paga à outra em troca do benefício recebido, ou seja, o Detran paga à Polícia Militar pela disponibilização de agentes militares para o exercício das atividades de vistoria. Então, está comprovado que o que existe é interesse financeiro e não um objetivo em comum, o que desvirtua a essência do convênio, até porque eventuais repasses de valores em convênios encontram-se vinculados aos fins pretendidos pelos mesmos”, explica a notificação recomendatória do MPE.
“Os valores percebidos pela Polícia Militar de Alagoas em razão do convênio encontram-se entrelaçados com o quantum arrecadado pelo Detran/AL em face das multas aplicadas, então, poder-se-ia estar criando um verdadeiro “mercado de multas”, com condutas por vezes abusivas, já que quanto mais multas fossem aplicadas, maior seria o valor levantado pela PMAL. Por isso, toda a situação relatada ofende os dispositivos legais citados, assim como os princípios gerais da Administração Pública, notadamente os da legalidade, moralidade e eficiência administrativas”, diz outro trecho da recomendação.
O promotor Coaracy Fonseca ainda alerta que, por afrontar alguns princípios constitucionais da Administração Pública, o convênio irregular pode constituir ato de improbidade administrativa e os gestores envolvidos no caso poderão sofrer sanções relacionadas aos crimes de enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e atentado contra os princípios da Administração Pública, também compreendida a lesão à moralidade e eficiência administrativas.
E, diante da notificação recomendatória, a Fazenda Pública Estadual dá prazo de 10 dias úteis para que se ponha fim ao Convênio nº 04/2012, cobrando ainda cópia do pedido de desligamento do referido convênio por um dos associados, ou comprovação do término do mesmo, para que a situação figure dentro da licitude, comprovando, assim, o desfazimento do vínculo.