Uma grande força tarefa, comandada pelo Grupo de Atuação Especial em Sonegação Fiscal e aos Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e Conexos (Gaesf), composto pelo Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL), Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz), Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e Polícia Civil (PC/AL), foi às ruas, nas primeiras horas da manhã desta quarta-feira (31), para prender servidores públicos acusados de cobrar propina de empresários. Eles recebiam quantias vultuosas para praticar fraudes fiscais, que ocorriam por meio da diminuição do valor a ser pago de impostos ao tesouro estadual.
Mais de 60 homens participaram das operações, que contou com o apoio da Polícia Militar, para dar cumprimento a oito mandados de prisões preventivas e dois mandados de busca e apreensão expedidos pela 17ª Vara Criminal da capital. Pela “Operação Nicotina”, fase III, foram presos Edgar Sarmento Pereira Filho e João Antônio Pereira Ramos, ambos fiscais de renda. Este último é sócio dos restaurantes Parmegiano (em Maceió e Recife) e Sal e Brasa.
Nesta investigação, o Gaesf descobriu um esquema criminoso envolvendo empresários do ramo do tabaco e fiscais de renda. Uma empresa que produz cigarros no Rio de Janeiro simulava o envio dos produtos para Alagoas como se fosse gozar do benefício fiscal oferecido pelo Estado, e que é devidamente regulamentado pelo Ministério da Fazenda. Isso evitava que ela pagasse os impostos à Sefaz carioca. No entanto, apesar das notas fiscais emitidas por Alagoas, a mercadoria jamais saiu do Rio. Ou seja, as notas fiscais por Alagoas tinham saída, sem o pagamento do valor devido de tributo. Isso significa dizer que o imposto nem era pago lá, nem aqui.
“Somente da ‘Operação Nicotina’, que começou em fevereiro de 2017, o Gaesf está conseguindo recuperar cerca de R$ 70 milhões. São 41 milhões em dinheiro e o restante está somado em quatro salas comerciais, três casas, um galpão, cinco veículos e dois terrenos. Tratam-se de bens que podem ser utilizados pelo Estado para abrigar repartições públicas, por exemplo”, informou o promotor de justiça Cyro Blatter, coordenador do Grupo.
“Apenas para exemplificar, o Hospital da Mulher, que está em construção, vai custar aos cofres públicos R$ 65 milhões. Isso significa dizer que o valor que estamos devolvendo ao tesouro estadual daria para fazer um novo hospital em Alagoas”, complementou o promotor.
Além das prisões, o Poder Judiciário também determinou o bloqueio de bens móveis e imóveis dos acusados.
Operação Equis Viris
Na primeira fase da “Operação Equis Viris” foram presos mais dois fiscais de renda. José Vasconcellos Santos e Luiz Marcelo Duarte Maia são acusados de cobrar propina de uma empresa, cujo nome está mantido sob sigilo para não atrapalhar o andamento das investigações.
Ambos estão afastados judicialmente desde a deflagração da “Operação Polhastro”, que investigou as fraudes ocorridas nas 42 empresas ligadas a Grife do Frango. José Vasconcellos Santos receberia propina do dono da empresa, enquanto Luiz Marcelo tentou atrapalhar as investigações.
O nome desta operação, “Equis Viris”, é uma palavra em latim que, na língua portuguesa, significa “com unhas e dentes”. O termo faz referência à voracidade com que os agentes públicos exigiam dinheiro em troca de facilidades tributárias.
Operação Rilascio
A terceira operação, “Rilascio”, também prendeu outros dois fiscais de renda: Alberto Lopes Balbino da Silva e Augusto Alves Nicácio Filho. Ainda foram presos Emanuel Raimundo dos Santos, mais conhecido como “Mané Queixinho”, funcionário aposentado da Sefaz, e o sargento PM da reserva Evaldo Bezerra Barbosa. Todos são acusados de fraudes fiscais, recebimento de propinas e lavagem de bens, dentre outros crimes.
“Rilascio” é uma palavra italiana que significa “libertação”. O sentido do nome faz relação à libertação dos empresários que não pagarão mais propina aos fiscais.
Emanuel Raimundo e Evaldo Bezerra eram as pessoas que recebiam os cheques e depósitos bancários relativos as propinas, promovendo lavagem de bens em conjunto com os fiscais. Eles ficavam com aproximadamente 8% dos valores, devolvendo o restante para os fiscais de renda.
O ciclo do esquema
Durante entrevista coletiva na tarde desta quarta-feira, o promotor de justiça Cyro Blatter explicou como se dá o ciclo criminal das organizações que cometem as fraudes. “Esse ciclo começa com as empresas que não querem pagar o valor real dos impostos devidos. Para isso, elas passam a falsificar documentos. Este é o primeiro passo. Na sequência, a empresa principal cria várias empresas fantasmas de forma que consiga burlar o fisco e permaneça no sistema de tributação que lhe gere menos pagamento de tributo. Nesta etapa, as fraudes estão estruturadas e a sonegação fiscal já está sendo praticada. Por fim, vem a lavagem de bens e o crime de corrupção, com o envolvimento de agentes públicos que vão ajudar a manter o ciclo criminoso”, detalhou.
“No topo da pirâmide estão as empresas reais. No meio, os agentes públicos, os laranjas e os testas-de-ferro e, na sua base, ficam a empresas criadas para fraudar o Estado”, acrescentou o coordenador do Gaesf.
Por enquanto, até a fase atual das investigações, o Gaesf já conseguiu comprovar os crimes de falsidade ideológica, falsificação de documentos públicos, falsificação de documentos privados, lavagem de bens e fortes indícios de sonegação fiscal. “Além de tudo isso, esse tipo de esquema acarreta uma concorrência desleal entre os empresários. Aqueles que pagam seus impostos corretamente serão prejudicados em razão dos criminosos terem melhor preço de mercado. E tem mais um agravante. O investidor de fora estudar o cenário econômico dos estados e, se ele perceber que em Alagoas há crimes fiscais, não vai querer trazer o seu empreendimento para cá. É por isso que a Sefaz é uma grande parceira do Ministério Público nesse tipo de investigação”, declarou o secretário estadual da Fazenda, George Santoro.
A apuração continua envolvendo tanto agentes públicos quanto empresários.