A grande atração do segundo dia do V Encontro Nacional de Memoriais do Ministério Público foram os personagens simbólicos que assumiram o microfone: a história, o patrimônio vivo, a comissão de defesa da memória e o memorial. Reunidos na perspectiva de desenvolver novas políticas para preservar a cultura de hoje e de ontem do Ministério Público Brasileiro, representantes de instituições ministeriais de 19 estados acompanharam, ao longo desta quinta-feira (25), análises e relatos sobre as iniciativas de cuidado com o patrimônio histórico do Parquet.

Quem abriu a jornada foi o historiador Gunter Axt. Ele abordou o conteúdo das cartas elaboradas nos encontros de Florianópolis, Brasília e Belo Horizonte, que deram início a tradição de registrar os avanços do debate neste tipo de documento. O historiador lembrou que algumas metas das cartas já estão se tornando realidade, a exemplo da implantação da Comissão Temporária de Memória Institucional promovida pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

O historiador destacou que, embora exista interesse de muitas gestões em desenvolver trabalhos de conservação da memória, o grande desafio dos memoriais está no desenvolvimento de políticas institucionais para a área, inclusive de abrangência nacional, com o objetivo de garantir a continuidade do esforço iniciado. “Precisamos convencer órgão nacionais como CNMP, CNPG, Conamp, CNCGMP e AMBRAMPA sobre a importância de efetivar um plano nacional de Promoção e de Proteção do Patrimônio Cultural e da própria História da Instituição”, explicou.

Nesse sentido, Gunter Axt apontou que a evolução dos memoriais passa por um plano de gestão estratégica, com assessoramento especializado para identificar especificidades teóricas e metodológicas próprias ao campo de patrimônio. “Também deve-se dar ênfase na relação entre a sua gestão e o desenvolvimento econômico e social das comunidades para não transformar os memoriais em um espaço corporativista, enclausurado em si mesmo. Por fim, recomendo o intercâmbio permanente da gestão documental”, disse.

Patrimônio vivo

O domínio da oratória aliado ao carisma e o vasto conhecimento sobre a instituição Ministério Público fizeram do procurador de Justiça aposentado e conselheiro do Memorial do Ministério Público Estadual de Minas Gerais, Joaquim Cabral Netto, uma das atrações mais dinâmicas da manhã desta quinta-feira. Em sua fala, ele ressaltou a importância de definir uma metodologia de pesquisa para garantir a impessoalidade do trabalho.

“Em um de nossos primeiros estudos, escolhemos 13 promotores e procuradores de Justiça mineiros de destaque que ingressaram no Ministério Público até 1935 para delimitar o recorte histórico. Para isso, foram colhidos dados e depoimentos sobre as autoridades, entre as quais estão seis ex-governadores de Minas, dois deles ex-presidentes da República, Epitácio Pessoa e Tancredo Neves”, disse.

Joaquim Cabral Netto também se aventurou no audiovisual quando abordou personalidades do Ministério Público de Minas Gerais. “Valorizo a história oral como complemento do registro documental. Filmamos e gravamos um ex-procurador-geral de Justiça e um ex-corregedor-geral do MP, ambos dos tempos de livre nomeação. Também pesquisamos sobre políticos mineiros que contribuíram com a instituição. Um deles foi o ex-ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel, que elaborou a Lei Complementar 40/1981, futuro texto referente ao Ministério Público na CF de 1988”, completou.

Memória institucional

O procurador da Justiça Militar Clauro Roberto Bortolli representou o conselheiro do CNMP Antônio Pereira Duarte na apresentação do projeto de resolução que cria a Comissão Temporária de Memória Institucional, conforme foi recomendado pelo carta do encontro de memoriais realizado em Belo Horizonte, no ano passado. Clauro Roberto entende que é preciso avançar na construção de uma cultura da memória, de modo tal que se internalize valores plantados no passado, que hão de repercutir no presente e projetar o futuro.

“A instituição desta comissão temporária no âmbito do CNMP viabilizará o desenvolvimento de meios uniformes para os Ministérios Públicos se organizarem internamente a fim de, não só tornar pública a forma como a instituição se posicionou e atuou em épocas pretéritas, mas também para construir uma identidade mediante o resgate da memória de quem trabalhou, relacionou-se e contribuiu com o Ministério Público brasileiro desde a sua criação”, falou o procurador de Justiça Militar.

Clauro Roberto leu o texto do projeto e informou que ele está aberto para alterações até o dia 15 de outubro antes de ser levado para a plenária do CNMP pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. A comissão deverá ser formada por conselheiros da entidade nacional, que também podem reivindicar membros colaboradores das demais unidades do Ministério Público.

Memoriais

Os memoriais dos estados do Rio Grande do Sul, Maranhão e Alagoas, juntamente com o Centro de Memória Digital do Ministério Púbico do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT), apresentaram seus respectivos trabalhos de preservação da memória institucional.

A promotora de Justiça Velocy Melo Pivatto é curadora do memorial do Ministério do Rio Grande do Sul. Ela destacou a restauração do prédio que foi destinado exclusivamente para preservação da instituição gaúcha. “Depois de torná-lo viável para o acesso de membros, servidores e população, conseguimos fazer dos seus três andares espaço para biblioteca, teatro, administração e até exposição de artes plástica, como a que está a aberta para o público, neste momento, com obras de adolescentes infratores sobre o Mito de Narciso, ou seja, um autorretrato deles mesmos”, disse.

Já o promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Maranhão, Cláudio Luiz Frazão Ribeiro, relatou as ações da Comissão Gestora do Programa Memória Institucional do órgão, que inclui memorial, concurso de monografias, plano editorial e política de conservação e preservação da documentação institucional. “Também queremos iniciar um projeto de história oral e outro para ter uma sede própria para o memorial”, complementou o promotor maranhense.

Em Brasília, destaca-se a linha do tempo do MPDFT, que faz um abordagem cronológica dos fatos que sucederam na história do órgão, da sua criação até o ano de 2013. O servidor Marcus Tito lembrou que o Centro de Memória Digital elegeu o trabalho interdisciplinar e integrado como uma das condições de sucesso: “Foi imprescindível o elo entre as áreas de arquivologia, comunicação social, seção de arquivo e direito. Também fizemos coleta de dados tanto no ambiente interno quanto no externo, tanto no MPDFT, quanto nos Tribunais Superiores”.

Scam 8

Já a coordenadora do Memorial Desembargador Hélio Cabral do Ministério Público do Estado de Alagoas, Gisela Pfau Albuquerque, também abordou as ações da unidade museológica, a exemplo das palestras, exposições, lançamentos de livros e projetos de interação com a sociedade, em especial, com estudantes. No entanto, ela também fez uso da voz para apontar caminhos ao trabalho de preservação da memória da instituição nacional, a partir da experiência com o software de sistematização da catalogação de acervo SCAM 8.

“O sistema nos possibilita, além de registrar o acervo com imagens, peças, documentos e livros na íntegra, página a página, também oferece acessibilidade para o portador de necessidade especial visual, uma vez que contém o áudio da ficha catalográfica e permite a inclusão dos áudios da memória oral. Mas o diferencial do SCAM8 é a busca de um determinado termo ou palavra, que nos leva a um registro ou aos registros que ele contenha. Este quesito permite a qualquer pesquisador localizar com rapidez em qual documento ou peça está o registro”, explicou com a ajuda de Carlos Alberto santos, da Emerion Consultoria, criadora do programa.

Os 19 estados presentes no V Encontro Nacional dos Memoriais do Ministério Público foram Acre, Alagoas, Amapá, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.