Falta de medicamentos, insumos e correlatos para atendimento odontológico, ausência de licença de funcionamento, alvará sanitário e projeto de combate a incêndio, deficiências estruturais que oferecem riscos a pacientes e servidores. Esses foram apenas alguns dos problemas constatados pelo Ministério Público Estadual de Alagoas (MPAL) no Centro de Especialidade Odontológica (CEO II) Rafael de Matos Silva, localizado na parte alta da cidade, e que levaram a 67ª Promotoria de Justiça da Capital a ajuizar uma ação civil pública (ACP) conta a Prefeitura de Maceió. Na petição, o promotor de justiça Paulo Henrique Prado pediu que o Judiciário obrigue o Município a fornecer todo o material necessário dentro de 15 dias e que uma reforma no prédio seja feita e concluída em até 6 meses.
A ação civil pública foi proposta depois da conclusão do inquérito civil nº 06.2019.00000598-0, que teve o objetivo de apurar possíveis irregularidades no abastecimento de insumos necessários à prestação do serviço de saúde bucal no município de Maceió. Os trabalhos começaram com fiscalizações realizadas in loco, em diversas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e também nos postos especializados em tratamentos odontológicos. Durante todas as inspeções, o promotor Paulo Henrique Prado esteve acompanhado do Conselho Regional de Odontologia (CRO/AL) e da Polícia Civil do Estado de Alagoas, de modo que as duas instituições, cada uma dentro das suas atribuições, também pudessem adotar as medidas cabíveis.
E a fiscalização ao Centro de Especialidades Odontológicas (CEOII) Rafael Matos Silva foi realizada no último dia 29 de outubro. “O que constatamos foi que, além de medicamentos vencidos e ausência de outros remédios e insumos, havia total falta de salubridade e condições para o atendimento da população”, disse o titular da 67ª Promotoria de Justiça da Capital.
O Conselho Regional de Odontologia, claro, acompanhou a inspeção. “A parceria do Ministério Público com o CRO/AL e demais conselhos veio enriquecer a efetividade da fiscalização, valorizando não só a classe odontológica, como também serviu para garantir um atendimento mais eficaz à população, disse Márcia Telma Tenório Guimarães, presidente da entidade.
A realidade encontrada
A petição detalha todos os problemas encontrados dentro do CEO II. “Constatou-se a presença de mofo nos 4 consultórios e na sala de radiologia, tanto na parede como no teto. No consultório 02, verificou-se que o lixeiro do lixo comum não possuía tampa. Na sala de radiologia, os 2 lixeiros também não possuíam tampa, e o lixeiro na verdade era um depósito de margarina, além da sala não ter armário. O ar condicionado do consultório 01 estava precisando de manutenção e um novo avental de chumbo para o paciente também era necessário. Ademais, comprovou-se que estavam faltando alguns materiais odontológicos: anestésico; flúor; balão de oxigênio para atendimento de pacientes especiais; e todo material para endodontia, visto que não estava sendo realizado atendimentos endodônticos por falta de material”, diz um trecho da ação.
“Além disso, verificou-se que, no consultório 04, o aparelho de RX tinha exposto um papel informando que o mesmo estava com defeito desde o dia 22 de outubro de 2019, mas o diretor José Gomes afirmou que já foi solicitado o reparo. Também foi relatado pelos profissionais que é muito comum chegar material vencido no CEO, sobretudo, material próximo de vencer. Dessa forma, foi feito o Termo de Notificação n° 68, concedendo o prazo de 30 dias úteis para regularização de tais infrações. O CEO possui escovódromo, mas este não funciona e o local serve, na verdade, de almoxarifado. Além disso, vale ressaltar que foi encontrada uma quantidade razoável de material odontológico vencido”, continua a ACP.
Situação estrutural
Quando da inspeção, Paulo Henrique Prado também comprovou a péssima condição estrutural do imóvel e, diante disso, solicitou ao setor de Engenharia do Ministério Público um relatório técnico a respeito daquela situação. E no documento entregue ao promotor foram especificadas todas as irregularidades encontradas: “deficiências nas estruturas de cobertura, instalações e esquadrias, que afetam diretamente a saúde e a segurança dos usuários do imóvel; presença de umidade próxima a pontos energizados da edificação; instalações elétricas improvisadas; disjuntores antigos, mal identificados e sobrecarregados; diversos ambientes com fiação energizada exposta (risco ao usuário); tomadas elétricas sem aterramento e fora dos padrões; fissuras na estrutura da laje e nas paredes internas e externas da edificação.
Também foi feita uma vistoria nas instalações hidrossanitárias. “Constatou-se que vasos sanitários estão desativados pela falta de manutenção; outros aparelhos sanitários estão sem assento; há pontos de esgoto apresentando vazamento; algumas instalações hidrossanitárias estão realizadas de forma improvisada; e a edificação não apresenta acessibilidade”, detalha a avaliação técnica, que alega ainda existir “risco grave à saúde dos funcionários e usuários pela total ausência de dispositivo de combate a incêndio e pânico”.
O que requereu o Ministério Público
Antes de formular todos os pedidos presentes à ação, Paulo Henrique destacou que o CEO II tem como função promover atividade “focada no diagnóstico bucal, com ênfase ao câncer; periodontia especializada; cirurgia oral menor dos tecidos moles e duros; endodontia; e atendimento a portadores de necessidades especiais”, chamando a atenção do Poder Judiciário para a importância da unidade de saúde.
E o promotor também cita legislações que tratam do tema. “A Política Nacional de Atenção Básica fala de garantia de acesso e de qualidade dos serviços, com oferta de cuidado integral e ampla resolutividade, fala em responsabilidade do gestor em garantir a infraestrutura necessária ao pleno funcionamento do serviço, com aporte dos recursos materiais necessários para tanto, tudo isso porque é de conhecimento público e notório que todo o Sistema Único de Saúde não pode funcionar da maneira concreta se a atenção básica à saúde bucal não desempenha o papel a que se destina! Porém, depreende-se de todo o exposto que, para o efetivo atendimento dos objetivos dessa Política Nacional, devem os Centros de Especialidades Odontológicas contarem com uma série de requisitos que vão desde a estrutura física até a disponibilização de medicamentos, insumos e recursos humanos adequados ao pronto atendimento. É importante salientar que a disponibilização de todos os recursos mencionados anteriormente pode fazer a diferença entre a vida e a morte do paciente que recorre ao serviço e que necessita de um tratamento ou da prevenção de doenças como o câncer”, argumenta ele.
“O Poder Público tem sido extremamente negligente na condução desta política. Como se falar em respeito à dignidade da pessoa humana e a todos os direitos fundamentais quando a estrutura das unidades está comprometida por mofo, infiltrações, móveis quebrados, salas de dimensões extremamente reduzidas? Como se falar em qualidade de serviço em um ambiente que não dispõe da mínima salubridade, onde são ofertados insumos vencidos?”, questiona Paulo Henrique Prado.
Em razão de todos os problemas encontrados, o Ministério requereu que o Município de Maceió seja obrigado a disponibilizar medicamentos, insumos e correlatos, dentro do prazo de validade, em até 15 dias. Também nesse prazo, a Prefeitura deverá providenciar a licença de funcionamento da unidade, alvará sanitário e projeto preventivo de incêndio aprovado pelo Corpo de Bombeiros, além das plantas das instalações de água, esgoto e eletricidade atualizadas e disponíveis para subsidiar a manutenção.
O Poder Executivo terá que ainda que promover, dentro desse mesmo prazo, o conserto de deficiências estruturais que possam oferecer risco a pacientes e servidores, tais como vidros e pisos quebrados, fiação exposta, lâmpadas queimadas, disjuntores antigos, rede elétrica inadequada, móveis quebrados, infiltrações, mofo etc.
Já em até 180 dias, o Município terá que fazer, de modo geral, a adequação de toda a estrutura do prédio do CEO II, de modo a permitir o seu perfeito funcionamento.