Expurgo. Esse é o nome da operação desencadeada, na manhã desta quinta-feira (24), pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e o Núcleo de Gestão de Informação (NGI) – ambas unidades pertencentes ao Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL), em parceria com a Polícia Militar, que foi às ruas para prender integrantes de uma organização criminosa liderada por policiais militares. Três PMs e quatro outras pessoas estão presas. Foram cumpridos 21 mandados de prisão e de busca e apreensão, todos expedidos pela 17ª Vara Criminal da capital. Os envolvidos são acusados de participação em crimes de roubo, tráfico de drogas e armas e invasão a residências.
Dos 10 mandados de prisão temporária – com validade de cinco dias, podendo haver prorrogação por igual período -, cinco foram contra dois oficiais da Polícia Militar e três praças. Estão presos os tenentes Tiago da Silva Duarte – que está lotado na 5ª Companhia Independente de Marechal Deodoro, e Wellington Aureliano da Silva – que trabalha na 3ª Companhia Independente de Paripueira, e o soldado Cyro da Vera Cruz Neto, que exerce suas atividades no Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran). Outros dois PMs estão sendo procurados.
Também foram presos Neilson Santos Dantas, Romoaldo de Souza da Silva, Dênis Novaes dos Reis Silva e um homem identificado apenas como Ramon. Todos foram detidos em suas residências e não reagiram a prisão. O Gaeco busca um quinto homem que também tem envolvimento com o bando.
Na casa da maioria dos sete presos foi apreendido farto material que o Gaeco acredita ser fruto dos assaltos praticados. Dentre esses produtos estão jóias, relógios, aparelhos eletrônicos, telefones celulares e pen drives, além de documentos em nomes de terceiros. Também foram recolhidas armas e balanças de precisão.
As acusações
As investigações do Gaeco duraram seis meses. Tudo começou quando o Ministério Público recebeu denúncias de que um grupo de militares estaria praticando assaltos em diferentes cidades do estado. A apuração seguiu e o Ministério Público teve acesso as câmeras segurança de uma casa que sofreu tentativa de roubo, no município de Santa Luzia do Norte. Nelas, estão imagens que mostram que a invasão ao imóvel contou com a participação dos tenentes Tiago da Silva Duarte e Wellington Aureliano da Silva.
Segundo as investigações, o bando teria invadido a residência porque recebera a informação de que a vítima estaria guardando, lá, a quantia de R$ 190 mil. O roubo foi frustrado porque o dono da casa desconfiou quando os supostos criminosos pularam o muro e se identificaram como policiais. Armado, ele atirou contra os invasores, que desistiram da prática do delito.
O Gaeco também descobriu que os militares costumam agir ao lado de outras cinco pessoas, e que todos cometem assaltos e comercializam ilegalmente armas e entorpecentes. Há denúncias também da prática de homicídios e estupros. Para esses dois últimos ilícitos, o MPE/AL prossegue com as investigações.
As provas
O procedimento investigatório criminal do Gaeco também descobriu que, em conversas reservadas, o tenente Tiago da Silva Duarte, que à época trabalhava no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP), admitiu receio de haver uma investigação em curso sobre a tentativa de assalto à casa de um morador de Santa Luzia do Norte, o que poderia terminar por incriminá-lo.
E, com a continuidade das investigações, o Gaeco também apurou que Tiago tramou um roubo a uma residência na cidade de Colônia de Leopoldina. “Um fato estarrecedor foi a assunção do compromisso de Tiago Duarte em retirar a viatura do Pelopes de Joaquim Gomes, no momento da futura ação criminosa, como forma de evitar que o assalto fosse frustrado ou houvesse confronto com a força policial local”, disse um trecho da representação criminal enviada aos juízes da 17ª Vara Criminal da capital.
Dessa ação, também participariam Romoaldo de Souza da Silva e o outro homem que está sendo procurado.
Os demais PMs
De acordo com os levantamentos do Gaeco, um dos militares que ainda não foi localizado tem envolvimento direto com vários crimes praticados pelos oficiais Tiago e Wellington. Num dos casos, ele teria participado de um assalto a casa de uma pessoa apelidada por “Grampo”. Lá, teriam sido roubados dinheiro, aparelhos celulares e uma porção de cocaína.
Outro assalto cometido pelo mesmo bando fora praticado contra a casa de um homem identificado como Sérgio Gaia, de onde foram retirados dinheiro e uma algema velha.
Já o soldado Cyro da Vera Cruz e o segundo PM que segue sendo procurado, além de também participarem das ações criminosas, são acusados de encobrir os ilícitos praticados pelos dois tenentes. Quando questionados por autoridades do Ministério Público sobre as suspeitas dos delitos que teriam sido cometidos por Tiago e Wellington, ambos sempre negaram conhecer qualquer fato.
Cyro da Vera Cruz é aquele mesmo soldado que, em 4 de junho de 2018, atirou contra a perna de um flanelinha em frente ao Fórum Desembargador Jairon Maia Fernandes, no Barro Duro.
Os pedidos de prisão e de busca
O Gaeco pediu a prisão de 10 pessoas, cinco PMs e cinco outros indivíduos que participam do mesmo grupo. “Os elementos informativos produzidos pelo Ministério Público expõe a materialidade dos crimes praticados em detrimento de várias vítimas, a exemplo de roubos, tentativa de latrocínio, invasão a domicílio, porte ilegal de arma de fogo, organização criminosa etc. Desse modo, a decretação da prisão temporária revela-se imprescindível às investigações em curso, a fim de impedir que os policiais militares e as pessoas civis investigados pertubem ou dificultem a produção de provas, ameaçando testemunhas e até mesmo eliminando a vida daqueles que saibam das atividades criminosas”, argumentaram os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado.
“Ressalte-se que o grupo criminoso investigado continua a operar nos mesmos moldes, embora desconfie que está sendo investigado”, completou o Gaeco.
Contra as casas dos 10 acusados também foram cumpridos mandados de busca e apreensão. “No caso em análise, não há dúvidas de que, nas residências dos investigados podem ser encontrados objetos e documentos capazes de instruir a ação penal a ser interposta e de formar a convicção do julgador. Enxergada como meio de prova, a busca domiciliar tem a finalidade de assegurar de forma direta a materialidade e, em alguns casos, até mesmo a autoria das infrações penais examinadas. Portanto, em face de sua essencialidade à futura relação jurídica-punitiva, ela poderá ser decretada até mesmo na fase de investigações preliminares, por requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público”, explicou um outro trecho da representação.
A operação ganhou o nome de “expurgo” porque essa palavra significa “eliminar algo, no sentido de desfazer-se de um problema”.
Fotos: Claudemir Mota e Dulce Melo